30 de set. de 2011

Estou tão cansada que chego a ser capaz de mentir.
Eis que
Desço dos 14 andares pra fumar um cigarrinho, tentar me manter acordada depois de mais de 13h em pé, na maratona do hilariamente chamado RIR, tendo dormido nada mais que 1 hora e meia.
Já são 15 horas e alguma coisa e os resquícios de energia que me sobram depois de tanto fervo e trabalho se esvaem com a fumaça que solto pela boca.
Surge então um ser absurdamente sorridente com um Black Power respeitável, magra, com sua simpatia reluzente e um texto pronto que não me deram chance de muita reação.
Objetivo: vender perfume, no mínimo demonstrá-lo.
Poderia ter usado mil subterfúgios, dizer mil coisas, qualquer uma que fosse desde um simples “desculpe, não quero!” que seria engolido com maior simpatia ainda, e me daria a função fácil de fechar o sorriso meia boca que eu tinha pra dar, e transformá-lo numa tromba gigantesca a esguichar-lhe um “qual a parte do ‘não quero’ você não entendeu?”
Ou mesmo: “querida, você é um amor de candura, mas já to dura e estamos no fim do mês”, mais uma chance de vir um revide, hoje em dia se faz qualquer coisa prometendo o pay day.
Haja saco!
Depois de tantos sorrisos recebidos, tanta velocidade em tramar uma frase na outra, a fim de não me deixar dar fim e fugir, já me oferecendo um frasco de algum cheiro disfarçado de charuto, fui vencida pelo cansaço e menti (descaradamente):
- Gata, desculpe! Não uso perfume.

E deu certo!

Carola Bitencourt
30/09/2011

22 de set. de 2011

Vida que segue!
Alívio que volta
ar que refastela brônquios
broncas internas fazem efeito
distância causa calor no peito
E o respeito recíproco por si mesmo
esmero na hora de dar grito
liberdade chega no meu estribilho
Revirei páginas pra colocar em ordem o livro
evoquei as sábias pra espalmar a queda
amorteci por carinho
caminho sem fim até a sorte
ressuscitada por sopros de vício esquecido
Eu disse que quando me refizesse
sua presença teria morrido!
Depois não diga que não avisei!

Carola Bitencourt
22/09/2011

21 de set. de 2011

Vi um vídeo da Esperanza Spalding agora a pouco. Como sempre me atendo a cada detalhe, além da qualidade, atentei para o combinado da vestimenta dos músicos que a acompanhavam. Quase terno, cabelos terminantemente convencionais e um talento nada parecido com a imagem estereotipada de um bom músico, ou os que a gente reconhece por aqui. Me lembrei deles. Esses músicos nossos que se esforçam tanto pra parecerem artistas e que aumentam cada vez mais sua esquiZitice pra destacar-se dos demais mortais que a seu ponto de vista não são artistas por não fazerem parte do que eu chamo de arte convencional (Dança, Teatro, Cinema, Baixo, Bateria, Pincel, ...).

Coisa essa, aliás, que caberia em outro texto, mas que defino aqui em algum pedaço deste: Considero arte qualquer trabalho bem feito. O cara que toca um violão de rodinha de luau e se considera o tal por fazer o melhor que pode, é nada mais que um mero aspirante a centro das atenções. Me vale muito mais como artista um engenheiro que não deixa o prédio ruir, ou o barco afundar. Artista não está no que se faz, mas em como é feito.

Travo a respiração quando percebo que um “poeta” me vem vender seus versinhos copiados do jornal de domingo (que nunca imprimiu poesia) e enche a boca vazia de dentes ou boas ideias pra dizer que É poeta. Assim como me inoja gente quem me critica por eu não dizer que sou poeta, quando me assumo nada mais que uma exercitante da língua. E me basto por isso, por essa!

A crítica cai, o ofício fica.

Então, lembrei de como minha visão liberta está subordinada a estas mazelas ensurdecedoras fincadas no meu, e talvez também no seu, fluido neuronal. Não reconheceria estes dois sujeitos acompanhantes desta MULHER com todas as maiúsculas, diga-se de passagem, caso não os visse impondo suas ferramentas.
Fiquei pensando em como já estive a mercê dessa alcova covarde de julgadores de essência espalhados por esse mundo. Por muito tempo achei que minha veste, fosse minha pele, e que minha pele deveria transparecer o que reluz por dentro do meu crânio. Oh!

Parei há tempos com esse desespero.

O que define um artista não é seu ar despenteado, nem seu all star surrado. Tampouco sua “blazezice” ou sua camiseta Clockwork Orange tatuada toda sexta feira no peito. O que define um artista é não enferrujar, é ser nerd tanto quanto sua tarefa lhe exige. É usar a matemática física do gasto de tempo com o exercício e a prática infindas do que se tem de fazer cada vez melhor: ARTE.

Carola Bitencourt

21/09/2011

13 de set. de 2011

Já não era seu cabelo mal cortado,
nem minhas unhas por fazer
Não era pelo abraço distanciado
nem pelo beijo obrigatório
Já não era pela mesmice das suas músicas repetidas
nem minha falta de inspiração
Nunca foi pelo seu sarcasmo reforçado de rancor
nem meu disco arranhado na mesma posição,
não foi porque desgastamos a pele um do outro,
nem por ter forçado o riso
quando o choro era a vontade.
Não foi porque eu queria dizer
e você já não olhava.

Foi porque pra agradar eu deixei o cabelo
e você, a barba crescer:
No meio de nós dois:
já não éramos eu e você.

Carola Bitencourt
13/09/2011

2 de set. de 2011

Éramos eu e ele primeiros. O cabelo dele grande liso, se enrolava no meu e de mais algum pedaço de corpo chafurdado nas almofadas do sofá, revirando plumas da bagunça que resultara nosso rodopio sincronizado pelo cômodo. Me enterrei naquela barba, segurei pela nuca. O arrepio frio vindo da janela escancarada subia pelas costas minhas sem incomodar. Doados ao espírito da entrega sem reconhecer rosto, sem lembrar da história individual, sem querer saber mais do que se entendia pela respiração acelerada e sonora. Agora era a hora certa, do jeito certo sem preposição marcada, nem cobrança crua, ou qualquer pensamento no próximo segundo. Enfim, conectos, perplexos pelo acerto em caber perfeitamente, somente satisfazendo a carência do que fosse e reconhecendo o sorriso no olhar entre aberto e fechado. Depois de toda a dança, do banquete, e do manjar, caídos cochilados entre cochichos de idealizar a próxima.
No terceiro assobio de sono, sorrateira, e silenciosa me fiz deslizando até a saída. Corri fugida, saí antes que a convivência humana e feroz amanhecesse meu sonho e fui dormir sozinha, na minha cama com meu verdadeiro amor. Eu de volta pra mim!

Carola Bitencourt
02/09/2011